“Government is essentially the negation of liberty.” — Ludwig von Mises (“O governo é essencialmente a negação da liberdade.”) “The institution of the state establishes a socially legitimized and sanctified channel for bad people to do bad things.” — Murray N. Rothbard (“A instituição do estado estabelece um canal legitimado e ungido para pessoas más fazerem coisas ruins.”) “[The state is] an institution run by gangs of murderers, plunderers, and thieves, surrounded by willing executioners, propagandists, sycophants, crooks, liars, clowns, charlatans, dupes, and useful idiots — an institution that dirties and taints everything it touches.” — Hans-Hermann Hoppe (“[O estado é] uma instituição conduzida por gangues de assassinos, saqueadores e ladrões, tendo à sua volta dispostos executores, propagandistas, patifes, vigaristas, mentirosos, palhaços, charlatões, imbecis e idiotas úteis — uma instituição que suja e macula tudo que toca.”) “Socialismo es todo sistema de agresión institucional contra el libre ejercicio de la acción humana o función empresarial.” — Jesús Huerta de Soto

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

A economia é a filosofia da tolerância (Garrett Petersen)


Tradução: Leandro Augusto Gomes Roque
Revisão: Marcelo Werlang de Assis

O mundo é repleto de esnobes. Há o esnobe da música, que é aquela pessoa que reclama que a maioria das pessoas prefere Lady Gaga a Stravinsky. Há o esnobe do cinema, que reclama que a maioria das pessoas prefere filmes de ação a filmes de arte. Há o esnobe da literatura, que reclama que a maioria das pessoas prefere 50 Tons de Cinza a Schopenhauer. E há o esnobe da culinária, que reclama que a maioria das pessoas prefere pizza a um fino sashimi.
Ou seja, qualquer que seja o assunto debatido, é tentador fazer um julgamento crítico sobre a preferência dos outros.
O bom economista, ao aprender economia — e ao absorver as suas lições —, aprende a ser menos esnobe. A sua análise econômica sempre parte do princípio de que as preferências das pessoas já estão por elas determinadas: e ele sabe que nada pode fazer quanto a isso. O bom economista, ao testemunhar uma pessoa pedindo pizza em vez de sashimi, vê apenas uma pessoa agindo com o intuito de alcançar um objetivo que ela, subjetivamente, considera ser o melhor. O bom economista é aquele que sabe deixar de lado as suas preferências pessoais, assim como as suas eventuais propensões à soberba, para fazer uma análise sem juízo de valor.
Até mesmo termos corriqueiros como “responsável” ou “irresponsável” estão carregados de juízo de valor. Atividades que reconhecemos como responsáveis — tais como poupar para a aposentadoria, evitar riscos para a vida ou para os membros do corpo e ter um estilo de vida saudável — são comportamentos consistentes com um arranjo específico de preferências. Uma pessoa que dê mais valor ao futuro do que ao presente (em termos mais economicistas: alguém que possui uma baixa preferência temporal) preferirá todos esses comportamentos.
Já atividades que reconhecemos como irresponsáveis — tais como gastar de maneira perdulária e depravada, correr risco de morte desnecessariamente, comer porcarias e utilizar drogas — também são comportamentos consistentes com um arranjo específico de preferências. Uma pessoa que pensa mais no presente e pouco se importa com o futuro (em termos mais economicistas: alguém que possui uma alta preferência temporal) será atraída por algumas dessas atividades.
A ciência econômica nos permite entender essas diferentes preferências, assim como as suas consequências; mas, por si só, ela não nos permite fazer juízo de valor; ela não nos permite determinar se um determinado arranjo de preferências é superior a outro.
A ciência econômica não faz juízo de valor. O seu objetivo é explicar fenômenos — as suas causas e consequências. E só. Juízo de valor é tarefa para a filosofia.
É bastante comum que vejamos um profissional bem-sucedido fazer um juízo crítico a respeito de familiares ou amigos que preferiram fazer farra em vez estudar e que, por esse motivo, hoje ganham menos que ele. Porém, ao fazer tal juízo, esse profissional está cometendo o erro de interpretar as ações dessas pessoas tomando por base as suas próprias preferências. Fazer farra certamente seria um meio ruim para alcançar o almejado objetivo do sucesso profissional, mas isso não significa que fazer farra tenha sido a escolha errada para aqueles que optaram por essa ação.
Com efeito, dado que cada indivíduo está mais bem informado sobre os seus próprios gostos e interesses do que terceiros, é perfeitamente factível crer que alguém que escolha a farra está agindo com a intenção de satisfazer da melhor maneira possível os seus fins.
O bom economista, pelo fato de estar treinado para observar as ações de terceiros sem fazer juízo de valor, acaba sendo mais tolerante na sua vida pessoal. Recentemente, o economista Russ Roberts disse gostar de “dar dinheiro para os miseráveis principalmente quando sabe que eles gastarão esse dinheiro com drogas e álcool. Afinal, quando você está desesperadoramente miserável, drogas e álcool podem ser exatamente aquilo que você mais quer.” Creio ser seguro presumir que Roberts, um economista com Ph.D., jamais esteve numa situação tão desesperadora quanto essa. E, ainda assim, ele demonstra o seu respeito pela autonomia dessas pessoas e também pela capacidade delas de escolher por si próprias. Ao agir assim, Roberts demonstra não se preocupar com o conteúdo das escolhas dessas pessoas. O que ele realmente não está fazendo é projetar as suas próprias preferências sobre esses indivíduos.
Existe uma corrente da economia moderna que deseja reintroduzir o juízo de valor a respeito das preferências de terceiros. Essa corrente é derivada da economia behaviorista (comportamental), a qual tem o objetivo de mostrar que as pessoas não se comportam “racionalmente” (no sentido neoclássico) ao buscarem os seus objetivos. De acordo com essa corrente, as pessoas são impulsionadas por vários erros, por várias influências e propensões.
Armado com as ferramentas de economia behaviorista, aquele nosso profissional bem-sucedido poderia alegar que os seus amigos e familiares menos responsáveis foram, na realidade, vítimas de influências. Ou seja, quando optaram por farrear em vez de estudar, eles não estavam verdadeiramente agindo com o intuito de alcançar, da melhor maneira possível, os seus objetivos. Eles estavam agindo de uma maneira consistente com as suas preferências daquele momento, mas não estavam atuando de maneira consistente com a sua “verdadeira” preferência, que seria aquela que os intelectuais seguidores da economia behaviorista estipularam ser a melhor.
O erro fundamental desse raciocínio behaviorista é fácil de ser percebido, mas só é percebido pelo economista bem treinado: não há nenhuma base teórica para definir qual comportamento representa os “verdadeiros” melhores interesses de cada indivíduo.
Se um indivíduo possui vários arranjos de preferências inconsistentes, como seria possível afirmar que um arranjo específico seja o “verdadeiro” e que todos os outros sejam “falsos”? É fácil deixar que as nossas preferências influenciem o nosso julgamento. O profissional bem-sucedido acredita que estudar em vez de farrear seria a preferência verdadeira simplesmente porque ele prefere estudar a farrear. O intelectual que preza a saúde acredita que a sua preferência por salada em vez de por batatas chips é a preferência verdadeira e, portanto, faz campanha para que as pessoas comam menos batatas chips e mais salada.
O bom economista deve saber resistir à tentação de inserir as suas propensões e preferências nas análises econômicas que realiza. A tolerância criada por essa maneira de pensar é um valioso efeito colateral do estudo da ciência econômica. Ela anda de mãos dadas com a noção de que o economista é tanto um estudioso quanto um observador neutro da sociedade — e não um mecânico ou um médico. É agindo assim que os bons economistas poderão, um dia, neutralizar aqueles totalitários que desejam dominar e impor a sua visão de mundo sobre todas as outras pessoas.

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